Na remessa de CD's recém-chegados dos EUA e de Espanha este perfilava-se como o mais sugestivo. Comecei por ele e, na verdade, dele ainda não saí... Considero-me em bem-aventurado transe, escutando-o repetidamente e encontrando cada vez mais motivos de deleite. Saiu há poucos dias (México e EUA) e assinala uma retorno. Com efeito, há 25 anos que Vicente Fernández não fazia um álbum exclusivamente de corridos. Tem, portanto, coerência temática. Além disso, é produzido com inusitado requinte, o qual se manifesta no grafismo do encarte (explanando pletórica iconografia da Revolução Mexicana), na qualidade da gravação e dos executantes. A voz, essa está melhor do que nunca. Continua poderosa e rica de nuances, tendo vindo a ganhar, com o tempo, um acento agreste. Fora do mundo da ópera não haverá voz, com excepção da de Mina, tão versátil. Num ápice vai do sussurro ao troar poderoso, sem fissuras. É expressiva nos mais diferentes registos e alardeia grandiosidade. Ou seja, as qualidades da interpretação de Vicente Fernández e a esmerada produção (Pedro Ramírez) puseram de pé um trabalho modelar! Todos os temas são fortes e todos se inserem na categoria de corridos tradicionais. Destaco: Valentín de la Sierra; El martes me fusilan - evocação dos levantamentos católico-tradicionalistas (Los Cristeros) contra o laicismo militante dos governos de Obregón e Calles nos anos 30; Valente Quintero; Los dos hermanos - um jogo de vozes entre um dueto sottovoce de Alejandro Fernández e Vicente Fernández Jr e a voz tenor do pai e protagonista, Don Chente; Le pusieron 7 leguas (mais um tema para a longa série de homenagens a cavalos).
É um álbum épico e, na intrínseca rudeza da sua matéria, na forma exímia como a trata, é sublime! A rudeza é a própria do género ranchero e, em particular, do corrido. Rudeza inscrita na temática das crónicas narradas, muitas delas centradas em heróis da Revolução Mexicana (1910-1919), mais ou menos subsidiárias da mítologia de Pancho Villa e Emiliano Zapata. São efectivamente crónicas, desenrolando tramas com impacto, repletas de violência. O epílogo chega, quase sempre, com a morte do herói, em estereotipado dramatismo. Sucedem-se cenas de fanfarronadas, desplantes absurdos e caprichos cruéis. Enfim, o politicamente correcto vive numa galáxia muito distante, como se pode apreciar neste exemplo: "que bonitos son los hombres que se matan pecho a pecho, cada uno con su pistola, defendiendo su derecho" (corrido de Arnulfo González).
Estes corridos consentidos entraram há muito na categoria de clássicos populares. Foi uma forma comum de perpetuar a memória de bandoleros, soldados, charros valientes y... caballos. É um completo devocionário de virtudes viris e valores essenciais. Aliás, o álbum tem uma faixa extra multimédia, que é um filme de animação, cujo enredo é significativo: Don Chente e seus dois filhos (Alejandro e Vicente Jr), passeando a cavalo, inquirindo estes sobre o seu famoso currículo de conquistador; o patriarca não dá confiança para se discutir o assunto, mas acaba por sair de cena abraçado a uma jovem, com visível vaidade de todos. É significativo, sobretudo, pela cumplicidade de valores varonis estabelecida entre pai e filhos. Na verdade, deste universo de corridos rancheros, o mulherio está num plano secundário. O seu lugar é o de figurante que ajuda a dar nexo à trama ou embeleza a paisagem. A excepção é enquanto mala mujer e/ou objecto de disputa, tornando-se um detonador de desgraças. Seja como for, como é evidente, não se deixa de cantar (e muito) o sexo, mas sempre em rigoroso plano machista. Os afectos e emoções que predominam são o amor paternal, o filial, o fraternal, assim como a camaradagem. Afectos e emoções que se sustentam em valores - precisamente os mais tradicionais e que, no caso, formam parte de uma imagem de um México profundo, que é já um mito. Enfim, para quem esse mito é sedutor e, particularmente, para quem conhece e gosta mesmo de música ranchera este álbum não é um apenas um álbum muito bom, é um objecto de culto!
Estes corridos consentidos entraram há muito na categoria de clássicos populares. Foi uma forma comum de perpetuar a memória de bandoleros, soldados, charros valientes y... caballos. É um completo devocionário de virtudes viris e valores essenciais. Aliás, o álbum tem uma faixa extra multimédia, que é um filme de animação, cujo enredo é significativo: Don Chente e seus dois filhos (Alejandro e Vicente Jr), passeando a cavalo, inquirindo estes sobre o seu famoso currículo de conquistador; o patriarca não dá confiança para se discutir o assunto, mas acaba por sair de cena abraçado a uma jovem, com visível vaidade de todos. É significativo, sobretudo, pela cumplicidade de valores varonis estabelecida entre pai e filhos. Na verdade, deste universo de corridos rancheros, o mulherio está num plano secundário. O seu lugar é o de figurante que ajuda a dar nexo à trama ou embeleza a paisagem. A excepção é enquanto mala mujer e/ou objecto de disputa, tornando-se um detonador de desgraças. Seja como for, como é evidente, não se deixa de cantar (e muito) o sexo, mas sempre em rigoroso plano machista. Os afectos e emoções que predominam são o amor paternal, o filial, o fraternal, assim como a camaradagem. Afectos e emoções que se sustentam em valores - precisamente os mais tradicionais e que, no caso, formam parte de uma imagem de um México profundo, que é já um mito. Enfim, para quem esse mito é sedutor e, particularmente, para quem conhece e gosta mesmo de música ranchera este álbum não é um apenas um álbum muito bom, é um objecto de culto!
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