quarta-feira, março 29, 2006

Geografia íntima (19)

Hélder Pacheco - Novos Guias de Portugal: Porto (1984)
Não conheço mais nenhum volume desta colecção Novos Guias de Portugal, mas se se aproximarem da qualidade deste, dedicado ao Porto, pois é caso para dizer que estamos bem servidos. Não é um comum guia para turista, pois pressupõe um interesse mais exigente. Com efeito, Hélder Pacheco é detalhista e alardeia uma cultura invulgar sobre história e património local. É suposto que o leitor partilhe saber e, se possível, paixão por estes temas.
Hélder Pacheco não é um portuense qualquer. É uma figura destacada da vida cultural da cidade e tem obra feita, quase exclusivamente, assente sobre a cidade. Nasceu, viveu e penso que ainda vive na "minha" freguesia da Vitória - bem no coração do velho burgo, onde se respira o genuíno espírito tripeiro. O Porto burguês e o Porto popular conviviam
muito de perto. Cada um no seu lugar, mas a paredes meias. Hélder Pacheco, que nasceu no lado burguês, conhece, porém, como ninguém o espírito do Porto popular e é ver ao longo do livro como desvenda origens de lugares, tradições e histórias do outro lado... Reconheci muitas dessas evocações nas minhas memórias dos tempos da minha infância em que aí passava invariavelmente todas as minhas férias escolares. Fico-me com uma delas: a "queima do Judas", no sábado de Aléluia. A canalha, fazia um boneco de palha e trapos. Depois, entre grande animação, com a gente da rua e ruas vizinhas apinhada na calçada, queimava-se o Judas, no meio de animados insultos. Acabava aí, de facto, o pesado jejum (estrito e lato senso) da Semana Santa. Assim regressava a animação quotidiana, durante alguns dias interrompida. Que tristeza quando hoje em dia lá volto e vejo que já não há canalha. Já quase só há velhos e poucos...
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domingo, março 26, 2006

Baúl de los recuerdos (12)


Rocío Dúrcal (1944 - 2006)
Morreu Rocío Dúrcal. Teve uma carreira multifacetada, embora, eu apenas tivesse contactado com a faceta de intérprete musical. Neste particular teve para mim uma curiosa importância: a primeira vez que ouvi rancheras mexicanas foi pela sua voz. Tratava-se de um álbum (suponho que o primeiro), entre os vários que gravou, de rancheras de Juan Gabriel. Foi essa ocasião no Verão de 1981, num autocarro de carreira, na auto-estrada, depois de Zaragoza, quando pela primeira vez fui a Barcelona. Sucede que o condutor era fervoroso amante de rancheras e brindou toda a comitiva de viajantes com a cassete desse álbum. Até Barcelona não se ouviu mais nada, já que virava militantemente a cassete sempre que esta chegava ao fim. De tal forma que foi com a toada "Me gustas mucho, me gustas mucho, tú..." metida na cabeça que desembarquei na cidade condal. Ao sair, perguntei-lhe quem era a cantora, ao que me respondeu ser Rocío Dúrcal, de quem eu sabia, vagamente, ser uma artista do cinema e das lides musicais. Mais tarde, em 1987, em Madrid, esse álbum foi um dos primeiros CDs que comprei - é, precisamente o meu CD nº11.
Vim a saber depois que Rocío Dúrcal não era mexicana, mas sim espanhola, de Madrid. Vim também a saber que, apesar de uma carreira musicalmente centrada na canção convencional, foi uma das maiores divulgadoras do género ranchero - facto que lhe granjeou uma grande popularidade no próprio México. Tinha uma voz vibrante e expressiva. Tinha também uma cara bonita - foi uma vedeta nos anos sessenta, em parte também por ter uma beleza dentro dos padrões dominantes na época. Enfim, perdeu-se uma grande artista, depois de nos últimos anos ter lutado contra um cancro que, desgraçadamente, acabou por vencer agora...
Página Web Rocío Dúrcal

Página Web de Juan Gabriel - Agora largamente dedicada a homenagear Rocío Dúrcal. Na parte superior podem-se seleccionar algumas faixas do recente álbum gravado a dúo pelos dois artistas (destaque-se El México de Rocío).

Página Especial El Corte Inglés - Música

terça-feira, março 21, 2006

Flamenco (15)



Falete - Puta Mentira (2006)

Eis uma das mais recentes demonstrações da heterodoxia do nuevo flamenco: Falete. Com efeito, este extravagante personagem entrou como um furacão num universo onde, apesar de tanta vitalidade e imaginação, não se tinha ainda visto um fenómeno assim: um descarado maricón, com um registo artístico correspondente. O crucial é, precisamente, o registo artístico, que é brilhante - uma sofisticada mistura de flamenco e copla, onde sobressaem as capacidades interpretativas. Na verdade, o artificialismo do personagem que Falete compõe, só tem valor por causa do genuíno sentimento da sua interpretação, patente no tom de voz e no arrebatamento (sem cair no histérico), que são credores das tradições confluentes do flamenco e copla. Além disso, note-se, não é apenas a imagem que é cuidadosamente produzida, o mesmo é extensível ao domínio estritamente musical.
Este álbum, o segundo, está exclusivamente integrado por temas do compositor Manuel Alejandro. Sobressaem dois: Puta Mentira e Sevilla. Poucas cidades têm sido tão cantadas como a capital andaluza. Contudo, entre as de mais recente lavra, esta homenagem de Manuel Alejandro conseguiu merecida projecção na voz de Rocío Jurado (cujo estado de saúde é, neste momento, grave). Pois sucede que Falete, seguindo inevitalmente outras pisadas, como que recria o tema de forma brilhante. Na sua página web, depois de se ter feito a divulgação do primeiro álbum e do contexto do aparecimento do artista (programa Ratones Coloraos, de Jesús Quintero, em Canal Sur TV), faz-se agora a divulgação de Puta Mentira. Aí pode-se apreciar na íntegra o tema que lhe dá nome.

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Página Web Falete

sábado, março 18, 2006

Viagens (27)

Norte
Prossigo a apreciação dos lugares que conheço em Portugal.
1ª coluna:
classificação - escala de 1 a 10; 2ª coluna: lugar; 3ª coluna: tipo de lugar.
Aveiro
07 Arouca (Localidade)
06 Castelo de Paiva (Localidade)
06 Esmoriz (Localidade/Praia)
07 Ovar (Cidade)
07 Serra da Freita (Serra)
07 Vale de Cambra (Localidade)
Braga
07 Braga (Cidade)
07 Costa Póvoa do Varzim-Viana (Costa)
09 Guimarães (Cidade)
10 Gerês (Serra)
Bragança
06 Bragança (Cidade)
05 França (Localidade)
07 Mirandela (Cidade)
08 Montesinho (Localidade/Serra)
08 Planalto Transmontano (Planalto)
Porto
09 Amarante (Localidade)
07 Carvalhos (Localidade)
07 Costa Espinho - Póvoa do Varzim (Costa)
07 Gondomar (Subúrbio)
09 Granja (Localidade/Praia)
09 Leça da Palmeira (Localidade/Praia)
07 Maia (Subúrbio)
07 Marco de Canaveses (Localidade)
07 Matosinhos (Subúrbio)
06 Pedrouços (Subúrbio)
06 Penafiel (Cidade)
09 Porto (Cidade)
07 Póvoa do Varzim (Cidade/Praia)
07 São Mamede d'Infesta (Subúrbio)
08 Vale do Douro (Vale)
06 Vila Nova de Gaia (Subúrbio)
Viana do Castelo
09 Caminha (Localidade)
08 Costa (Viana - Caminha)
07 Melgaço (Localidade)
08 Monção (Localidade)
07 Ponte da Barca (Localidade)
08 Vale do Lima (Vale)
10 Vale do Minho (Vale)
08 Valença (Localidade)
09 Viana do Castelo (Cidade)
Vila Real
08 Alvão (Serra)
08 Chaves (Cidade)
08 Marão (Serra)
07 Peso da Régua (Cidade)
10 Vale do Douro (Vale)
06 Vila Real (Cidade)
Viseu
08 Lamego (Cidade)

sexta-feira, março 10, 2006

Tiro ao Alvo (9)

Choderlos de Laclos - As Ligações Perigosas (Les Liaisons Dangereuses) 1990 (1782)

Este foi um caso em que o cinema me conduziu à leitura. Em finais dos anos 80 vi dois filmes construídos sobre a mesma história, a qual corresponde a um romance de finais do século XVIII. Já não sei qual dos dois vi primeiro, se Ligações Perigosas ou Valmont. Gostei bastante de ambos, se bem que o trio Glenn Close, John Malkovich, Michelle Pfeiffer seja sublime e se avantaje sobre o correspondente trio Colin Firth, Annette Bening, Meg Tilly. A qualidade e tipo de realização (Stephen Frears vs Milos Forman) equivalem-se. Mas, o que me seduziu foi, acima de tudo, o tipo de história e a sua ambientação.
Não há nada mais cultural do que o sexo. Não se pode ignorar nunca o rebarbativo lugar-comum de que o amor significa mais frequentemente infelicidade do que o seu contrário. Este facto está consagrado pelo bom-senso, pese embora a tola publicidade hedonista triunfante e é, enfim, o reconhecimento da natureza eminentemente cultural do amor. O que de melhor e pior há na espécie humana aflora neste território implacável. Pura, vã, ridícula ilusão a de se pretender que a "educação sexual" pode ter algum lugar na evolução da espécie que não o de ser mais um elemento para a desagregação de valores da civilização. Mas se se pretende alguma educação formal neste domínio, pois há que dizer que os "manuais" serão de um tipo radicalmente distinto do que o polticamente correcto imagina... Com efeito, histórias de perversidade como a que serve de sustento a estes dois filmes, demonstram-nos que amor e sexo são domínios de cultura (sentido antropológico) e carácter. Mulheres e homens combatem com as suas armas cruéis e aqueles que não têm armas ou talentos nestes combates arriscam-se a ser dizimados. Ora, as convenções sociais, com toda a sua estimável canga moralista, não existem por acaso; existem (ou existiam...), sobretudo, para proteger os mais fracos e, assim, garantir coesão na vida social. Foi precisamente em certos momentos e lugares (os ambientes da aristocracia francesa do século XVIII, por exemplo) onde tais regras e convenções entraram em crise, que a sociedade começou a desagregar-se (O Marquês de Sade é um prelúdio da Revolução Francesa...).
Não admira que ao longo do século XIX o romance de Laclos tivesse sido censurado e, pode-se dizer, considerado maldito. Os costumes burgueses não poderiam ter outra atitude. Na verdade, ele põe a nu mecanismos de perversidade de que a espécie humana é capaz - enfim, o que a sociedade sabe, mas que convencionou fazer de conta que não sabe. Transpira sageza por todos os poros e é uma cabal demonstração literária de como a espécie fornica com os neurónios. Além disso, a sua leitura, através de uma original forma epistolar, revela-se um subtil jogo psicológico enriquecido por pormenores a que o cinema não pode atender.

Choderlos de Laclos - As Ligações Perigosas (1782)
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Página Web sobre Choderlos de Laclos

Stephen Frears - Dangerous Liaisons (1988)
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Info IMDB
Dangerous Liaisons

Milos Forman - Valmont (1989)
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Info IMDB Valmont

Rádio (7)


Cadena Dial via Internet
É curioso verificar que minha rádio preferida soa em directo na Internet e agora também com opção banda larga - o que minimiza um pouco a má qualidade audio inerente a este meio (por enquanto...). Aí por 1987 lembro-me de sintonizar em Madrid Radio Callao, cujo nome alternava com Radio Corazón. Parecia-me o correspondente radiofónico da prensa del corazón. Entre 1989 e 1991, nas minhas viagens por Espanha, deparei-me com a nascente Cadena Dial. Pareceu-me ser uma herdeira dessa emissora, tanto mais que em Madrid ocupava a mesma frequência (91.7). Era uma pequena cadeia de emissoras (pouco mais de uma dúzia, então) de carácter exclusivamente musical e assente numa fórmula original. Com efeito, o seu lema era 24 horas de música en español. Gostava do carácter evidenciado por tal opção, além de que sempre adorei música espanhola ou cantada em espanhol. Como se não bastasse, agradava-me o despretenciosismo do modo como a fórmula era levada à prática e tinha uma particular predilecção pelos seus encantadores jingles. Quando demandava Espanha pela fronteira do Caia, ainda antes de Estremoz começava a busca no autorádio da Dial Extremadura, de Badajoz. Espanha fora, era-me grato acompanhar as transições entre as diferentes emissoras Dial, conforme se ia desenrolando a viagem - assim a modos de uma legenda sonora anunciadora da próximidade de diferentes cidades...
Quando em 1993 instalei uma antena parabólica não foi para ver TV, mas sim para ouvir rádios de Espanha e Itália. Pude começar a ouvir quotidianamente a Cadena Dial. Desde então é a mais fiel companhia cá de casa, sendo que, desde 1998, a recebo com qualidade digital, através de um receptor do Canal Satélite Digital, do qual, aliás, fui subscritor durante um ano.
A
Cadena Dial tem mudado - tornou-se uma grande cadeia, mas, desgraçadamente, desapareceram os jingles dos primeiros anos e alguns programas magníficos, (como um sobre salsa, do qual não recordo o título mas ainda recordo a nome da voz jovial da sua apresentadora, Cristina Tárrega). Contudo, permanece fiel à ligeireza (os programas são poucos, mas agradáveis; ainda impera a radiofórmula) e, basicamente, permanece fiel ao bem-aventurado totalitarismo hispanófono, se bem que já não seja impossível depararmo-nos com pequenas heresias (já ouvi cantar em Português - um fado de Mísia e já houve, inclusivamente, todo um programa dedicado à música brasileira). Deve-se assinalar que tais excepções dizem respeito à latinidade e só têm discreto cabimento no espaço limitado de certos programas. A minha Cadena Dial ainda tem coisas deliciosas: na programação actual, entre as 20:00 (19:00 em Portugal) e as 24:00 (23:00) (poucas vezes posso ouvir), há um espaço para músicas pedidas com dedicatória, que faz lembrar o nosso saudoso Quando o Telefone Toca, só que muito mais informal. Haverá fenómeno radiofónico mais encantador do que poder encomendar uma música com dedicatória para a amada (ou amado)?

Viagens (26)

Prossigo o inventário de lugares conhecidos através de Castela e Leão.
1ª coluna: classificação - escala de 1 a 10; 2ª coluna: lugar; 3ª coluna: tipo de lugar; 4ª coluna: província.

09 Burgos (Cidade) Burgos
09 La Bureba (Planalto) Burgos
09 Poncorbo (Desfiladeiro) Burgos
09 Boñar (Localidade) León
08 Cistierna (Localidade) León
09 León (Cidade) León
09 Picos de Europa - Gargantas del Yuso (Serra) León
10 Picos de Europa - Puerto de San Glorio (Serra) León/Cantabria
09 Riaño (Localidade/Lago/Serra) León
07 Campo Charro (Planalto) Salamanca
08 Ciudad Rodrigo (Cidade) Salamanca
05 Fuentes de Oñoro (Localidade) Salamanca
09 La Alberca (Localidade) Salamanca
09 Miranda del Castañar (Localidade) Salamanca
08 Peña de Francia (Serra) Salamanca
10 Salamanca (Cidade) Salamanca
08 San Martín del Castañar (Localidade) Salamanca
09 La Granja de San Ildefonso (Localidade/Palácio) Segovia
08 Guadarrama - Puerto de Navacerrada (Serra) Segovia/Madrid
09 Pedraza de la Sierra (Localidade) Segovia
10 Segovia (Cidade) Segovia
08 Medina de Ríoseco (Localidade) Valladolid
09 Tierra de Campos (Planalto) Valladolid
07 Calabor (Localidade) Zamora
06 Campos del Tera (Planalto) Zamora
09 Lago de Sanabria (Lago/Serra) Zamora
09 Puebla de Sanabria (Localidade) Zamora

terça-feira, março 07, 2006

Boulevard nostalgie (21)



Léo Ferré - Les Poetes: Volume 3 (Verlaine et Rimbaud) 2000 (1964)
O velho anarquista Léo Ferré merece amplo destaque dentro da chanson. Neste domínio, Aznavour à parte (num registo completamente diferente), Ferré foi sempre o meu preferido. Tinha um talento especial: o de pôr em música grandes poetas. Foi o contraponto das suas limitações poéticas... Na verdade, o que foi inteiramente composto por si demonstra uma sensibilidade assolada pelo panfletarismo. Felizmente que a sua capacidade para compôr bonitas canções compensou tal limitação. Mas, de facto, o seu esplendor está na forma magistral como musicou poetas "malditos": Charles Baudelaire, Guillaume Apollinaire, Paul Verlaine e Arthur Rimbaud (também Louis Aragon, mas quanto este é exagero qualificá-lo como maldito...) Neste domínio, o ponto mais alto foi a forma como em 1967 musicou Les Fleurs du Mal, de Baudelaire. Este facto, porém, não deve obscurecer que três anos antes editara o duplo álbum Verlaine et Rimbaud chantés para Léo Ferré. Eis aqui uma associação verdadeiramente digna do qualificativo maudit! Verlaine e Rimbaud foram malditos, desde logo pela sua vida - concretamente pela sua tempestuosa e sórdida relação. Foi uma vivência marcada pelo alcoolismo, homossexualidade, masoquismo e sabe-se lá que mais... Erráticos pelas estradas da Bélgica ou pelas ruas de Londres, sobressairam nos ambientes de comunards exilados pela sua forma de vida escandalosa. Foram tempos de emoções fortes que deram brado... Contudo, depois de Verlaine ter alvejado a tiro Rimbaud - provavelmente num acesso de ciúmes - a relação entre ambos entrou em crise definitiva, da qual resultaria o afastamento para sempre de Rimbaud, não só do seu companheiro, mas também da vida artística e cultural. Depois de uma incrível sucessão de episódios aventureiros num curto espaço de tempo (alistamento na marinha holandesa, deserção em Java, errância escandinava numa trupe de circo), Rimbaud assentou como um filisteu: negociante estabelecido em paragens exóticas (entre Áden e a Etiópia), renegando o seu passado. Pasme-se que toda a sua obra poética foi feita até aos 20 anos de idade! Rimbaud, pelo seu lado, nunca se recompôs da perda e ao longo de anos e anos tentará em vão reatar a relação perdida.
Férré musicou alguns dos mais conhecidos poemas de ambos (curiosamente, não o fez com o famoso Le Bateau Ivre, de Rimbaud). Com o seu talento de compositor e com a orquestração de Jean-Michel Defaye conseguiu um resultado espectacular. É evidente que tal implicou uma espécie de comunhão espiritual entre "malditos anarquistas"... Exemplares são os temas Il Patinait Merveilleusent (Verlaine), Le Buffet (Rimbaud), Les Corbeaux (Rimbaud), Ô Triste, Triste Était Mon Âme (Verlaine) e Les Pensionnaires (Verlaine). Neste último, a música consegue reforçar adequadamente o forte erotismo do poema.
Esta edição em CD aparece integrada numa colecção de três volumes que é a compilação de álbuns de Léo Ferré para a editora Barclay, dedicados a Baudelaire, Verlaine, Rimbaud e Apollinaire. Além da colecção corresponder a um conceito coerente, tem uma apresentação condigna.
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domingo, março 05, 2006

Noites tropicais (10)



Astrud Gilberto - Astrud Gilberto Plus James Last Orchestra (1986)
Astrud Gilberto foi a voz (e em certa medida também o corpo) que personificou a Garota de Ipanema. Em 1963 protagonizou com João Gilberto (então seu marido) e com Tom Jobim o boom da bossa-nova. A eles se juntou o saxofonista de jazz Stan Getz. Como se não bastasse tanto talento junto, o produtor Creed Taylor (trabalhava então para a Verve) caprichou em cuidar superiormente este novo género e surgiram então algumas obras-primas.
Astrud rompeu os seus laços maritais e ficou nos Estados Unidos. Filha de mãe
baiana e de pai alemão, tinha uma voz original (quente, num sensual timbre de gatinha doce...), assim como uma figura ajustada aos padrões de beleza dos sixties. Com o tempo, o seu repertório foi deslizando de um género reconhecido e respeitado (incluindo o exigente público do jazz) para algo mais vulgar. Em meados dos anos 70 a sua estrela já tinha declinado. Só saiu da penumbra em meados dos anos 80 com este álbum. É um produto declaradamente easy listening ou não fosse co-protagonizado pelo inefável James Last mais a sua orquestra. Por uma vez, porém, este famoso orquestrador (alemão, como o pai de Astrud) abandona os pastiches e demonstra cabalmente as maravilhas de uma grande orquestra ligeira. Há ainda as participações de Ron Last e Paulo Jobim (como pares para duetos). A produção tem uma qualidade fantástica e o exercício de embalar com sofisticação e requinte temas brasileiros, ou de sabor brasileiro, resulta em cheio! A voz de Astrud (já quarentona) ainda patenteia aquele timbre inconfundível... Claro está que um certo pedantismo não deixará de encarar produtos como este com o desprezo que costuma votar ao easy listening. Haverá mesmo quem diga tratar-de de música de elevador... Pois que seja, mas é pura delícia para ouvidos civilizados, sugerindo champagne and caviar (é este, apropriadamente, o título de um tema... composto pela própria Astrud), penthouse, piscina, limousine e tutti quanti o bom-gosto e o dinheiro podem dar... Como sabe bem este muito suave tropicalismo artificial!
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