sexta-feira, novembro 10, 2006

Viagens (45): Norte de Itália / Julho - Agosto de 2001 (4)

Viagem ao Norte de Itália (Julho/Agosto de 2001) 3º Dia

De manhã, ao sair do hotel, pude finalmente constatar aos encantos de Florença. A luminosidade e a ausência de fadiga permitia-me uma visão diferente. Deparei-me logo com a imponência do Palazzo Strozzi e com a igreja de Santa Maria Novella, que tem uma fachada onde sobressai o contraste entre as linhas entremeadas de cinzento claro e de cinzento escuro, o que se repete, aliás, em vários outros edifícios religiosos e laicos.
Um dos problemas que afectou a estadia foi a avalanche turística que me dissuadiu de engrossar as longuíssimas bichas para entrar em sítios fundamentais. Porém, ainda pior foi a onda de calor, com temperaturas máximas em torno dos 37º e mínimas que não desciam dos 23º. Florença foi protagonista desta vaga e os telejornais repetiam imagens de turistas banhando-se nas fontes.
A Catedral de Santa Maria del Fiore (Duomo) é um dos ex-libris da cidade. A grandiosidade da cúpula, de Brunelleschi, contrasta com a graciosidade das linhas de todo o edifício, em particular com a fachada e o Campanille (torre sineira). Há formas geométricas nos mesmos tons de Santa Maria Novella. Sempre tive queda pelos excessos barrocos, contudo, o classicismo florentino, nomeadamente o que se pode apreciar no Duomo, é de insuperável elegância, sem renunciar a pormenores decorativos. Ainda assim, o interior pareceu-me não estar à altura do exterior. O baptistério, edificado à parte (em Pisa também é assim), bem no centro da praça, é imponente. A Porta do Paraíso (Leste) atraía uma descomunal fila de turistas, cuja maioria, talvez, não soubesse estar perante uma réplica. O original está no vizinho Museo dell’opere del Duomo. Todo este conjunto monumental, visto de cima não deixaria de se assemelhar a torrões de açúcar atacados por um formigueiro. Os turistas são aqui uma completa amostra da humanidade - pude ver, por exemplo, uma excursão de turistas hindus.... Muitos faziam parte de grupos guiados que se embrenhavam por ruas esconsas. Mesmo em sítios aparentemente comuns paravam, banhados em suor, escutando o guia. Em boa verdade, qualquer recanto pode exalar história e a arte pode assaltar a partir de um qualquer saguão. Pouca coisa comum deve haver no centro de Florença... O vulgar turista, mesmo aquele que detém alguma sensibilidade para as coisas da arte e da história, corre o risco de enfartamento. Mas, não se pense que é uma cidade museu, no sentido, em que esteja desprovida de vida normal. Tem cerca de meio milhão de habitantes e um intenso tráfico adaptado às contingências de uma morfologia medieval. Contudo, note-se, que não se vislumbra em todo o centro um único edifício moderno! Este e outros sintomas denotam que a cidadania está orgulhosa do estatuto ímpar da sua urbe.
A Via dei Calzaiuoli é o eixo que atravessa o centro. Um pouco mais ampla que as restantes ruas, exclusivamente reservada a peões, vem desde o Duomo, passa perto da Piazza della Repubblica e desagua na Piazza della Signoria. A Piazza della Repubblica está composta por edifícios novecentistas, de linhas clássicas, ocupados por companhias de seguros. Está rodeada de cafés com esplanadas, onde os turistas são alegremente espoliados pelo consumo de um Cinzano ou de um gelato. A Piazza della Signoria é a ágora – o coração cívico. Impressionei-me quando lá cheguei e dei de caras com o ex-libris máximo, o Palazzo Vecchio e a sua torre comunale. Lá estão estátuas célebres como Perseu, de Benvenuto Cellini e, sobretudo, Davide, de Michelangelo. Mas, é evidente que são réplicas... Naquela manhã de primeira segunda-feira de Agosto, aquele lugar parecia palco de um quase tumulto, tal era a quantidade de turistas emocionados que tropeçam uns nos outros, de máquina fotográfica em riste. Com efeito, muita gente chega aqui com a emoção com que um muçulmano chega Meca. Perante a visão do Davide com a moldura do Palazzo Vecchio atrás, sente que cumpriu um desígnio superior – muitos não se contêm e tratam de utilizar o telemóvel para participar o evento a um algum ente querido distante. Para mim não foi muito distinta a sensação de atravessar a Ponte Vecchio, que até os nazis não tiveram coragem de bombardear... Todas as lojas da ponte, com uma única excepção, são ourivesarias. As montras ostentavam peças a preços inalcançáveis. Mas mais importante foi comprovar que dessa ponte mítica se pode apreciar um pôr de sol especial... Toda o dia foi ocupado em deambulações pedestres – é a única forma adequada de conhecer a cidade. Quando caiu a noite foi uma surpresa verificar que não havia gente na rua na quantidade que seria de esperar. Depreendi que em Itália há pouca animação exterior nocturna, sobretudo, atendendo às potencialidades dos espaços e ao que ocorre, por exemplo, em Espanha.

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