sábado, novembro 25, 2006

Galícia (15)

Uxía - Estou vivindo no ceo (1995)
Há uma deriva na música galega, que se transformou numa corrente dominante desde há muito tempo. É a da influência irlandesa. Resulta da consciência do carácter céltico da cultura popular galega, o qual, se bem que legitimado por muitos elementos objectivos, não deixa de ter uma certa dose de mito. Independentemente do grau de autenticidade, a verdade é que os frutos dessa deriva têm produzido resultados interessantes. Contudo, o álbum em apreço representa uma outra deriva, a qual, em proporções muito mais modestas não deixa de ter os seus representantes. É a da influência portuguesa. Note-se que é uma corrente modesta em termos musicais, mas, verdade se diga, que existe no galeguismo intelectual uma corrente com peso, cuja expressão em termos de doutrina linguística é o reintegracionismo, ou seja, a defesa da reintegração do idioma galego nas normas ortográficas e fonéticas da língua portuguesa. Por este exemplo se pode aperceber o romantismo utópico que grassa nessas hostes... Seja como for, existe entre essa gente, de forte empenhamento político (geralmente alinhado com o Bloque Nacionalista Galego), uma natural simpatia pelas coisas portuguesas.
Uxía Senlle, ex-integrante do grupo Na lúa, enquadra-se nestes meios. Meios onde, por exemplo, a figura de José Afonso foi uma referência. Este álbum é uma cabal demonstração do peso dessa referência, ou não se desse o facto de incluir três versões de famosos temas dele: Verdes são os campos (soneto de Camões),
Milho verde (tradicional) e Senhora do Almortão (tradicional). Significativamente, a produção artística é de Júlio Pereira. Contudo, não deixaria de ser um álbum banal se se limitasse a estas recriações de sabor requentado e sem inovações de registo. Na verdade, e em contra-tendência com o tributo lusitano, abre com uma jóia de valor excepcional, que é genuinamente galega: Alala das Mariñas, um tradicional da região do mesmo nome, no nordeste da província da Coruña e noroeste da província de Lugo. Que belo fulgor de espessa melancolia passa por este canto de nostalgia emigrante! Sublime!
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Uxía: Alala das Mariñas in Estou vivindo no ceo (1995)

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