A Família Bellamy (Upstairs, Downstairs) (Série I e II)
Nos tempos em que a televisão ainda não se tinha tornado tão desgraçadamente democrática era mais fácil produzir séries com a qualidade de Upstairs, Downstairs (Desabafo: ninguém de bom senso pode ignorar que, em muitos aspectos, democracia é sinónimo de mau gosto e ineficácia...). Se é certo que, apesar de tudo, a TV actual continua a fazer produções de qualidade, não é menos certo que estas têm agora menor visibilidade e chegam a mais escasso público. Os anos 70 talvez tivessem sido os anos de apogeu da televisão. Esta série é um argumento para sustentar tal tese. Seja como for, foi com produtos deste calibre que os ingleses adquiriram a fama de ser os mais exímios criadores de séries televisivas de qualidade. Algo que, note-se, não se restringia à BBC. Esta, por exemplo, foi da responsabilidade da London Weekend Television, que integrava o consórcio de emissoras privadas ITV, liderada pela Granada TV.
Nunca mais me esqueci da série, que seguira com devoção. Não me esqueci, sobretudo, das figuras do mordomo Hudson e da cozinheira Bridges. Revista agora, trinta anos depois, a série adquire mais atractivos. Ressalto, por exemplo, o encanto dos valores sociais não contaminados pelas ideias igualitaristas e socializantes, nomeadamente a noção de hierarquia, respeito e etiqueta. O mundo da criadagem tinha uma noção precisa do seu lugar no mundo, com uma esmerada ética servil, que não deixava de conter um certo orgulho. Algumas reflexões e advertências do mordomo Hudson, da cozinheira Bridges e, até, da criada de sala Rose denotam um sentido de realização pessoal através desses valores. Reflectem uma auto-consciência da função servil como peça de uma vasta engrenagem social, sem a qual, esta não funcionaria tão bem. Tudo isto é ilustrativo de como a sociedade inglesa de inícios do Século XX (a acção das Séries I e II situa-se antes da Grande Guerra de 1914-18) era uma sociedade liberal, mais marcada por valores aristocráticos do que por valores democráticos. Mas a genialidade consistiu não só em fazer chegar à ficção televisiva a realidade da sociedade inglesa dos tempos eduardianos, mas fazê-lo através de uma abordagem com envolvência humana, utilizando uma linguagem de emoções e valores que soube tocar todos os públicos.
De notar que há no DVD um documentário com interessantes informações, assim como há um sítio exclusivamente dedicado à série (The Upstairs Downstairs Web Pages) com informações extensas e detalhadas. Definitivamente, é uma série de culto...
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Nunca mais me esqueci da série, que seguira com devoção. Não me esqueci, sobretudo, das figuras do mordomo Hudson e da cozinheira Bridges. Revista agora, trinta anos depois, a série adquire mais atractivos. Ressalto, por exemplo, o encanto dos valores sociais não contaminados pelas ideias igualitaristas e socializantes, nomeadamente a noção de hierarquia, respeito e etiqueta. O mundo da criadagem tinha uma noção precisa do seu lugar no mundo, com uma esmerada ética servil, que não deixava de conter um certo orgulho. Algumas reflexões e advertências do mordomo Hudson, da cozinheira Bridges e, até, da criada de sala Rose denotam um sentido de realização pessoal através desses valores. Reflectem uma auto-consciência da função servil como peça de uma vasta engrenagem social, sem a qual, esta não funcionaria tão bem. Tudo isto é ilustrativo de como a sociedade inglesa de inícios do Século XX (a acção das Séries I e II situa-se antes da Grande Guerra de 1914-18) era uma sociedade liberal, mais marcada por valores aristocráticos do que por valores democráticos. Mas a genialidade consistiu não só em fazer chegar à ficção televisiva a realidade da sociedade inglesa dos tempos eduardianos, mas fazê-lo através de uma abordagem com envolvência humana, utilizando uma linguagem de emoções e valores que soube tocar todos os públicos.
De notar que há no DVD um documentário com interessantes informações, assim como há um sítio exclusivamente dedicado à série (The Upstairs Downstairs Web Pages) com informações extensas e detalhadas. Definitivamente, é uma série de culto...
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7 comentários:
Diez sobre diez
Poldark, La linea Onedin
Thames Television, Los Roper, Un hombre en casa, Benny Hill.....
Feliz Año 2.006, Sr. Tavares.
Robert Graves.
Antes dos Bellamy, já outra família fazia êxito na TV - a Forsyte - iniciando, se bem me lembro, a longa sucessão de excelentes séries de produção britânica. O êxito desta durou, até aparecer a "Família Bellamy", bem mais marcante. Lembro-me,também, de muitas outras séries: "Isabel I"; "As seis mulheres de Henrique VIII"; "Reviver o passado em Brideshead". A "Família Bellamy", pude revê-la, recentemente, na RTP Memória e, de facto, vista muitos anos depois é possível detectar muito do que então passou despercebido. Por exemplo, o título que arranjaram para a série (o eterno problema dos títulos...) desvirtua o verdadeiro significado do original - "Upstairs, Downstairs" - a vida dos "de cima" e a dos que, remetidos à sua condição servil (orgulhosos ou não)ocupam a parte "de baixo", numa alusão às duas classes que habitam a casa. Dos personagens, sempre me chamou a atenção Hudson - a figura da competência e do brio profissional, valores tão escassos nos tempos que vão correndo, em que as tarefas manuais, executadas por "pequenos parafusos", são olhadas com desdém.
"Noção de hierarquia", "respeito e etiqueta" há que cultivar, independentemente dos projectos sociais...
TC
Mensaje para TC: tu tío, el Sr. Salvado tuvo la amabilidad de enviarme libros de poesía muy interesantes, por los que quedo eternamente agradecido. Un abrazo.
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