quarta-feira, março 21, 2007

Viagens (53): Norte de Itália / Julho - Agosto de 2001 (7)

5º Dia (4ª Feira)(manhã/tarde)
Era o último dia em Florença. Às duas horas da tarde tomaria o comboio para Milão. A manhã estava destinada, custasse o que custasse, a visitar a Galleria dei Uffizi. Mas, uma vez aí chegado, a bicha que se me deparava foi um desafio à maior tenacidade… Ao fim de três quartos de hora continuava no mesmo sítio. Nessa altura foi difundida informação de que me aguardavam três horas de espera! Ou seja, quando lá entrasse, disporia de meia hora até chegar ao comboio… Abandonei a bicha em errância ociosa e frustrada. Foi uma despedida melancólica que se foi arrastando até à estação. Este é, talvez, o único edifício moderno do centro, mas com uma arquitectura de qualidade. Em todo o caso não foi por considerações de ordem arquitectónica que acabei por chegar tão cedo. Fui-me arrastando do átrio exterior para o átrio de embarque porque estava um tanto frustrado com a cidade, tal como me foi dado vê-la. Queria ir embora, na certeza de que gostaria de voltar um dia em circunstâncias bem diferentes.
Sempre me atrairam os comboios. O que me poria em Milão em duas horas era rápido, silencioso e confortável. Não era de alta velocidade, mas não estava longe desse nível. Os Apeninos foram atravessados em estreitos vales e intermitentes túneis. Em pouco mais de meia hora estava na Emilia Romagna e pouco depois parava em Bolonha - a sua principal cidade. Esta é a região de mais elevado nível de vida da Itália. Ocupa a metade sul da planície do . A fertilidade dos seus campos já era celebrada nos tempos em que os romanos construíram a Via Emilia, que acabou, aliás, por dar o nome à região. Não é apenas a agricultura que é produtiva. Alguma da tecnologia mais desenvolvida do mundo tem aqui a sua sede. Basta mencionar um símbolo: Ferrari. É também um território tradicionalmente esquerdista... Foi-o sobretudo no passado, graças ao peso de um extenso proletariado agrícola. Bolonha foi durante muito tempo um exemplo de gestão do PCI, que tinha aí uma espécie de feudo modelar. Por outro lado, foi também nesta região onde surgiu, nos anos vinte, a mais poderosa base de apoio do fascismo, entre os grandes agrários e as classes médias das suas cidades provincianas. Enfim, ao longo do século XX foi um cenário de bipolarização extremada. Não por acaso, as tramas burlescas de Don Camillo (série de filmes dos anos 50, protagonizados por Fernandel), estavam situadas num aldeia da região.
A seguir a Bolonha o comboio passou por Modena, Reggio nell’Emilia, Parma (cidade de Giuseppe Verdi), Piacenza. São cidades com história, de média dimensão. A planície, sempre verde e salpicada de casas, estende-se até perder de vista.
Entre e Piacenza e Cremona chegou-se à Lombardia. O povoamento tornou-se ainda mais denso. O arredores de Milão foram anunciados pela suburbanização da paisagem. A Estação Central de Milão é monumental - quer pela quantidade de linhas, composições e gente, quer pelas dimensões do edifício. Pode-se dizer que se desembarca em cenário imponente. O percurso de táxi até ao hotel trouxe-me uma impressão inicial que não podia ser melhor. É de bom tom dizer-se que, para além do Duomo e da Útima Ceia, Milão mais nada tem que ver... Sempre suspeitei que tais impressões resultariam de a ver com os mesmos olhos com que se vê Veneza, Florença, Roma. Pelo que sabia, achava que a capital económica da Itália não seria, necessariamente, desinteressante. Acertei. Aliás, transcendeu as minhas expectativas. É uma cidade elegante e, além disso, deu-me desde logo uma sensação: de todas as cidades conhecidas (Nova Iorque incluída) deveria ser a de mais elevado nível de vida.

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