domingo, outubro 29, 2006

Extravagâncias (2)

Peter Webber - Rapariga com brinco de pérola (Girl with a pearl earring) (2003)

Desde logo, este filme assenta numa boa história - uma ficção construída em torno do enigmático quadro homónimo do pintor holandês Jan Vermeer. Não há bom filme sem boa história. Neste caso, a história, da escritora Tracy Chevalier, já fora um êxito como livro. O essencial começa, portanto, aqui. Contudo, há mais a destacar. Por exemplo, a fotografia (curiosamente, de um português, Eduardo Serra) consegue uma luminosidade adequada para a acção. Mais importante ainda são as interpretações, a começar pelas dos protagonistas, Scarlett Johansson (criada / modelo) e Colin Firth (pintor). A primeira compõe a figura da beleza nórdica por excelência, enriquecida por um registo de contenção, magistralmente acorde com o carácter do personagem que encarna. O filme proporciona algumas imagens construídas em torno do seu rosto, que são de invulgar beleza e constituem um paradigma já um pouco perdido nestes tempos em que a representação da beleza é geralmente alvo de interferências grosseiras... Com efeito, evitam-se os recursos demagógicos e o filme desenvolve-se por parâmetros de rigorosa castidade (não encontro melhor termo) no que concerne à relação entre pintor e modelo, nomeadamente na sua representação visual. Ou seja, não há nudez. Contudo, tal não obsta (bem pelo contrário...) a que, em muitas cenas, se instale a sensualidade. O interdito interiorizado pelos personagens centrais tem, assim, a sua coerente correspondência no que é dado a ver ao espectador.
Há ainda um aspecto que me seduziu: a reconstituição do ambiente da cidade de Delft, no terceiro quartel do século XVII. Os pormenores referentes ao vestuário, situações e lugares denotam rigor. É, portanto, também excelente como divulgação histórica, nomeadamente das condições de vida daquelas que eram, há cerca de 350 anos atrás, as populações com melhor nível de vida do mundo. Delft
(genuinamente holandesa) era, sem dúvida, um exemplo de opulenta cidade europeia desses tempos. E, no entanto, como era uma realidade rude comparativamente com a nossa, actual...
Uma nota final para referir que este filme foi distribuído em DVD, gratuitamente, pelo Expresso. Foi o último de uma série de oito DVDs. Foi uma insólita prenda proporcionada pela guerra dos semanários. Não deixa de ser bizarro que para enfrentar o aparecimento do Sol, se enveredasse por um táctica comercial tão extrema... Os leitores ficaram ganhar. Lástima foi eu não ter conseguido os dois primeiros.

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1 comentário:

Anónimo disse...

Abriu-me o apetite para ler o livro!

Seve