Pamplona / Iruña
A capital de Navarra é uma cidade de identidade dividida, à imagem do seu duplo nome oficial. E a vários níveis pode-se assinalar uma espécie de sobreposição de duplas identidades: Castelhana vs Basca; Popular vs Burguesa; Tradicionalista vs Moderna... Curiosamente, já na Idade Média a cidade estava dividida em dois burgos: Navarrería e San Cernín; no primeiro concentrava-se a população basco-navarra; no segundo, a população de origem francesa. A junção formal não resolveu ferozes rivalidades. O edifício municipal, localizado precisamente onde hoje está o seu sucessor, de exuberante fachada barroca, foi, aliás, estrategicamente construído em local neutro, entre os dois burgos. Tão acusado estigma de divisões dá à cidade uma auréola de dramáticos excessos, para a qual concorre, ainda mais do que qualquer outro factor, a imagem de marca que granjeou no mundo à conta dos Sanfermines. Contudo, é uma cidade, onde, segundo os mais variados padrões, se vive bem. Como outras cidades de média dimensão do norte da Espanha, Pamplona permite gozar benefícios das metrópoles e benefícios do viver provinciano; mas tem acrescido pitoresco e casticismo. É na cidade antiga, precisamente nas artérias por onde correm os touros (com destaque para a Estafeta), onde se concentram tais atractivos. Aí se exerce o culto das tapas y pinchos em inúmeros bares e se patenteia a memorabilia sanfermínica em não menos numerosas lojas de recuerdos. São ruas estreitas e antigas, repletas de gente, situadas em torno da ampla Plaza del Castillo, onde há música e outros espectáculos de rua.Fora do perímetro antigo, temos os Ensanches, onde impera o sossego, o bem-estar burguês provinciano. Alarga-se em avenidas arborizadas, entremeadas por parques. Destacam-se edifícios modernos - hotéis, empresas, escolas, clínicas e hospitais. Com efeito, aí aprecia-se uma outra faceta menos conhecida do turista comum: a de pólo universitário e hospitalar. O seu centro é a Universidad de Navarra, abrangendo várias instituições de ensino, clínicas e hospitais privados. É um complexo de excelência, conotado com a Opus Dei. Está na vanguarda em certas especialidades da ciência, em particular, da medicina. Por esta razão, aqui se realizam congressos e afluem estudantes, investigadores e doentes. Os modernos hotéis florescem muito mais à conta desses visitantes do que dos turistas festivos dos Sanfermines. É interessante, como o tradicionalismo católico, que sob a forma de carlismo aqui se implantou beligerantemente contra a modernidade, de algum modo contribuiu para uma certa forma de modernidade. Hoje em dia, não é obvio rever em Pamplona o feudo reaccionário que foi em momentos decisivos da história contemporânea espanhola. Exige um certo esforço imaginar, por exemplo, o General Mola a abrir as hostilidades da Guerra Civil, arengando numa Plaza del Castillo repleta de fanáticos carlistas, prontos para todas as violências, de cruz em riste... Além do mais, as marcas do tradicionalismo, patentes em algum património monumental, parecem desfasadas da cidadania ou ambiguamente valorizadas. A ambiguidade está na exaltação do ambivalente autonomismo fuerista, que é partilhado pelo tradicionalismo e pelo nacionalismo basco. Aliás, marcas mais evidentes, ainda que, talvez, mais artificiais, são as da identidade basca. Artificiais, porque parecem decorrer mais do militantismo político do que da realidade sociológica. Três exemplos: Veêm-se mais ikurriñas (bandeiras bascas) do que bandeiras navarras, não obstante não terem acesso aos edifícios oficiais; não são raras as manifestações de apoio aos radicais independentistas bascos (presenciei uma, silenciosa, de familiares de presos etarras), mas a maior parte das pessoas é-lhes indiferente ou hostil; todas as artérias estão rotuladas em castelhano e basco, mas, ao contrário das pequenas localidades do norte de Navarra, não se ouve falar basco nos bares e nas rua.
Há ainda a Pamplona periférica, constituída por localidades suburbanas (Villava, Huarte, Berrioplano, Berriozar...). São bairros residenciais e zonas fabris. Lembra-nos que a cidade é um pólo industrial composto por pequenas e médias empresas e por uma grande fábrica, da Wolkswagen. É uma zona onde se reencontra a paisagem suburbana comum às periferias citadinas de Espanha, composta por bairros incaracterísticos de classes médias baixas e por recentes urbanizações de vivendas geminadas, de sectores sociais mais elevados. Entre estas, encontram-se algumas zonas residenciais de qualidade, como Zizur Mayor/Zizur Nagusia. Seja como for, esta realidade dá-nos conta desse delírio de especulação infrene assente na construção civil, que assolou a Espanha nos últimos anos. Felizmente, no caso de Pamplona, algumas das consequências urbanísticas menos agradáveis são atenuadas por uma progressiva transição para um ambiente rural. Com efeito, rapidamente se entra num cenário de belas paisagens, em especial, pelo Norte, onde vislumbram-se já os encantos dos Pirenéus. Sublinhe-se este aspecto, já que, efectivamente, o enquadramento geográfico é uma mais-valia para a cidade, a qual está num vale formado pelo Rio Arga, entre as montanhas e a meseta. É um local estratégico, a um pulo de realidades humanas e naturais de grande beleza, mas contrastantes.
2 comentários:
En la Universidad de Navarra estudiaron periodismo Pedro J. Ramírez y José Antonio Araquistain Oñatibia
General Antonio Ramalho Eanes, Doctor por la prestigiosa Universidad de Navarra
Enviar um comentário